DA FUNDAMENTAÇÃO DA PRISÃO PREVENTIVA: PERICULUM LIBERTATIS

Ao se analisar a temática da prisão preventiva, essencial destacar, antes de mais nada, o princípio da presunção de inocência, que no art. 5º, LVII da Constituição, assenta que “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”.

Sem dúvida, o nível de observância deste princípio dita, em grande parte, o nível de qualidade de um sistema processual penal. Trata-se de um verdadeiro princípio fundamental de civilidade.[1]

A questão que se coloca, portanto, guarda relação com a necessidade da prisão cautelar, coexistindo com a ausência de sentença penal condenatória.

Para que tal desiderato seja possível, alguns princípios devem ser observados e entre eles está o princípio da fundamentação das decisões judiciais.

Assim, para se decretar a prisão preventiva de alguém, é necessário que o pedido venha acompanhando de um mínimo de provas, mas suficientes para demonstrar a autoria e a materialidade do delito e que a decisão judicial seja fundamentada.

Todavia, além da probabilidade de cometimento do delito, imperioso ainda que se tenha na decisão um fundamento atinente a alguma das hipóteses previstas no art. 312 do Código de Processo Penal.[2]

Sendo assim, além da probabilidade do cometimento de um delito, deve-se coexistir um os mais fundamentos previstos no mencionado artigo e que se consubstanciam no perigo que decorre do estado de liberdade do sujeito passivo.

Ocorre que, quando da elaboração da decisão de prisão preventiva, deve-seatentarpara que opericulum libertatisencontre-se comprovado nos autos, de modo que não bastam presunções ou ilações como fundamentos da prisão cautelar.

O perigo gerado pelo estado de liberdade do sujeito passivo deve estar claramente evidenciado na decisão de decretação da prisão cautelar.

Sobre os conceitos ilação e presunção, tem-se que [3]iação é o ato de fazer conjecturas baseadas em hipóteses, em suposições, em dados baseados em presunções.

Já a presunção Etimologicamente, reproduz termo que se originou a partir do latim praesumptionis,[4] que significa “ideia antecipada”.Uma preposição costuma tomar como verdade uma suposição, algo que ainda não foi confirmado ou comprovado, mas que é alvo de especulação.

Pois bem.

No Habeas Corpus 116757/SP, o Supremo Tribunal Federal, por intermédio de liminar proferida pelo Ministro Marco Aurélio, reafirmou-se a necessidade da decisão de prisão preventiva evitar utilizar-se de presunções e ilações como sustentáculos da fundamentação, sob pena de violar-se o princípio da presunção de inocência.

A ver:

Portanto, além de potencialização dos elementos contidos na denúncia,ensejando suposições, não se afigura adequado, para fundamentar a necessidade da prisão preventiva, utilizar-se de elementos que adentrem ao mérito da causa em tal medida que acabem até mesmo por antecipar o juízo a respeito da culpabilidade ou não do sujeito passivo.

O cuidado para se fundamentar a decisão deve estender-se até mesmo aos termos utilizados, não sendo crível, por exemplo, que uma decisão de prisão preventiva se utilize de proposições tais como “o acusado praticou o fato a ele imputado”, ou “praticou o fato de forma violenta”. Ou seja, há que se guardar um cuidado, já que a decisão de prisão preventiva limita-se a dizer a necessidade ou não do cerceamento da liberdade do sujeito em razão da necessidade de acautelar o processo.

Do mesmo modo, os fundamentos atinentes a intranquilidade da população com a suposta pratica delituosa podem constituir ilações e presunções que não encontram respaldo fático probatório.

Sendo assim, reafirmado posicionamento jurisprudencial sobre a matéria, tem-se que a decisão de decretação de prisão preventiva deve estar sempre alinhada com o princípio da não culpabilidade, acenando sempre pela configuração de elementos suficientes ao juízo de probabilidade, evitando ilações e presunções.

[1] FERRAJOLI, Luigi, Derecho e Razón – teoria delgarantismo penal. Trad. Perfecto Andrés Ibánez: Alfonso Ruiz Miuel: Juan Carlos BayónMohino, Juan TerradillosBasocoCantareroBandrés, 2. Ed Madrid, Trotta, 1997. P 549.

[2] Garantia da ordem pública, garantia da ordem econômica, conveniência da instrução criminal (tutela da prova) e assegurar a aplicação da lei penal.

[3] https://www.significados.com.br/presuncao/

[4] https://www.significados.com.br/presuncao/